Filosofia

Por que nos elogiamos tão pouco?

Artigo originalmente publicado pelo site Razão Inadequada.

Outro dia aprendi com alguém que elogios são como abraços. Não li em um livro, muito menos estudei em uma aula, mas descobri pelo afeto de uma palavra doce, um momento desses em que parecem ter caído mil fichas. Antes de tudo, é preciso valorizar os breves segundos em que a vida te desarma, em que a surpresa te quebra em pedaços em que o tempo se adensa e parece querer se repetir.

Não sabemos receber nem dar elogios. Muito cedo nós aprendemos a engolir os elogios e cuspir as críticas. Acho que ligamos muito rápido elogio com submissão e crítica com superação, é uma hipótese. Ou talvez não consigamos de fato querer a diferença que se apresenta na percepção do outro sobre nós mesmos; ou ainda seja muito elogiar (ou receber elogios de) alguém que não se parece conosco; talvez nós sejamos inseguros demais para dar crédito ao elogio de alguém qualquer, alguém que não seja o chefe, o professor, o tal, o devidamente autorizado a elogiar.

Ah, como nossas relações são mesquinhas. Em matéria de elogios, parece que jogamos Espinosa no lixo e ficamos com Freud, terrível! Há quem distribua elogios para conquistar, um colonizador distribuindo pirulitos; há quem precise de elogios para viver, uma máquina desejante subnutrida; há quem só elogie em troca de algo, um especulador do mercado das boas palavras; há quem elogie cada vez menos por desconfiar tanto de quem elogia, um atrofiado da sensibilidade.

Busquemos os bons encontros, deixemos o ego de lado. Há de se parar com toda essa mania interpretar, esse é o primeiro passo. Abrir-se para o afeto e não para o seu duplo, aquele que achamos ser o verdadeiro, aquele que está por detrás das coisas, que precisa de análise, que é a essência do que nos acontece, que só pode ser alcançado com muita reflexão. Não precisamos de nada disso, pense no elogio dos loucos, no elogio das crianças, no elogio das mães, no elogio dos amantes.

Hegel haverá de me desculpar, mas não nos abastecemos somente de reconhecimento. Não somos balões infláveis. Não temos nada o que poupar. Não criamos uma existência esperando pelas congratulações, pois nisso não há afirmação suficiente. Não se trata de reconhecer, mas de compor! Há no elogio qualquer coisa de intensa, qualquer coisa bonita na vazão espontânea dos sentimentos, nos dançarinos que giram por si mesmos, nos pássaros que cantam mesmo depois de acasalar, no som que não quer silenciar, na brincadeira sem hora de terminar, no elogio que se dá por se dar. Busquemos as palavras que atravessam!

Pensar Contemporâneo

Um espaço destinado a registrar e difundir o pensar dos nossos dias.

Recent Posts

Inspirada em obra de Dostoiévski, comédia sombria com Joaquin Phoenix vai te deixar pensativo por dias, na Netflix

Há quem procure algo diferente na hora de escolher um filme, sobretudo quando o tema…

19 horas ago

7 filmes sobre traição onde a infidelidade teve consequências devastadoras

Desconfianças, segredos e reviravoltas acompanham as relações humanas desde sempre. No cinema, o tema da…

20 horas ago

Evolution of Slot Machines and the Rise of Online Slot Gaming

The evolution of slot machines has been marked by a significant shift from mechanical systems…

5 dias ago

Impulsione seu jogo de apresentação com slides e conteúdo gerados por IA

    No mundo acelerado de hoje, as apresentações foram além de slides estáticos e…

6 dias ago

The Future of Slot Machines and the Digital Revolution

Transition to Digital Slot Games As technology continues to evolve, slot machines are now transitioning…

6 dias ago

No Salão Oval, filho de Elon Musk manda Trump calar a boca: ‘Você tem que ir embora’; veja vídeo

Um momento inesperado marcou um encontro entre Elon Musk e Donald Trump na Casa Branca.…

1 semana ago