Se você for a uma grande livraria e estudar o conteúdo das prateleiras de autoajuda, provavelmente poderá agrupar os títulos oferecidos em duas grandes categorias. Primeiro, os livros que dizem como ganhar muito dinheiro rapidamente. E, segundo, os livros sobre como lidar com a baixa auto-estima.
Essa combinação não é uma coincidência: os dois gêneros parecem necessários, quase inevitáveis companheiros de cama. As sociedades que insistem que as oportunidades de sucesso são ilimitadas e universais consignam involuntariamente seus membros menos bem sucedidos a sentir que eles têm apenas a si próprios para culpar por seus fracassos. Aqueles que estão na base das chamadas sociedades meritocráticas e cheias de oportunidades acabam não apenas pobres, mas também envergonhadas.
Um dos paradoxos mais duradouros da vida moderna é como as sociedades mais ricas do que nunca poderiam ter fracassado tanto no trabalho de serem mais felizes do que nunca. Como podemos ter tanto, mas ainda nos sentimos tão ausentes?
Uma possível resposta está na psicologia por trás da maneira como decidimos o que é suficiente. Nosso senso de um limite apropriado para realização e riqueza nunca é decidido de forma independente. Decide-se comparando nossa condição com a de um grupo de referência, com a das pessoas que consideramos como iguais. Não podemos apreciar o que temos em isolamento; nem podemos julgá-lo em comparação com as vidas de nossos antepassados medievais. Não podemos ficar impressionados com o quanto somos prósperos em termos históricos. Só nos levaremos a ser bem-sucedidos quando tivermos tanto ou mais do que as pessoas com as quais crescemos, trabalharmos juntos, tivermos amigos ou nos identificarmos na esfera pública.
O rígido sistema hierárquico em vigor em quase todas as sociedades ocidentais até o século 18 havia negado toda a esperança de movimento social, exceto em casos raros. Era injusto em mil maneiras óbvias demais, mas oferecia àqueles nos degraus mais baixos uma liberdade notável: a liberdade de não ter que levar as conquistas de tantas pessoas na sociedade como pontos de referência – e se verem severamente carentes de status. e importância como resultado.
Era uma liberdade, porque sempre era improvável que alguém alcançasse o auge da sociedade. Talvez seja tão improvável que hoje pudéssemos ter tanto sucesso quanto Bill Gates, no século 17, poderíamos ter nos tornado tão poderosos quanto Luís 14. Infelizmente, porém, não parece mais improvável – dependendo das revistas que se lê, pode parecer absurdo que alguém ainda não tenha conseguido encontrar uma ideia de negócio para revolucionar o comércio global.
Uma das poucas ambições compartilhadas pelos políticos em todo o espectro partidário-político é a de criar uma sociedade totalmente meritocrática; isto é, uma sociedade na qual todos aqueles que chegam ao topo o fazem apenas por causa de seus talentos e habilidades (e não por causa do privilégio injusto – pais de classe alta, amizade com o chefe e assim por diante). Este ideal meritocrático trouxe naturalmente oportunidade a milhões.
Indivíduos talentosos e inteligentes, que por séculos foram pressionados dentro de uma hierarquia imóvel, estão agora livres para expressar seus talentos em um campo de jogo mais ou menos nivelado. Mas há, inevitavelmente, um lado mais obscuro dessa idéia de meritocracia: pois se realmente acreditamos que criamos (ou poderíamos até criar um dia) um mundo em que o bem sucedido realmente mereceu todo o sucesso, segue-se necessariamente que precisamos manter os fracassos exclusivamente responsáveis por sua falta de sucesso.
Em uma era meritocrática, um elemento de justiça entra na distribuição da riqueza, mas também na distribuição da pobreza. O fracasso não parece meramente lamentável, mas também merecido.
Há duas maneiras de fazer as pessoas se sentirem melhor consigo mesmas: dar-lhes mais dinheiro ou restringir seus desejos. As sociedades modernas tiveram sucesso espetacular no primeiro; mas, ao estimular continuamente os apetites, eles ao mesmo tempo ajudaram a negar uma parte de suas realizações mais impressionantes. A maneira mais eficaz de recuperar a auto-estima pode não ser tentar ganhar mais dinheiro ou ganhar mais fama. Pode ser nos distanciar – praticamente e emocionalmente – de qualquer um que consideramos ser igual a nós e que tenha mais sucesso do que nós.
O preço que pagamos por esperar ser muito mais do que nossos antepassados é o sentimento permanente de que estamos longe de sermos tudo o que podemos ser.
Artigo de Alain de Botton escrito e publicado no site NewStatesManAmerican
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