Por Carolina Michelini / via: Coletivo Leitor
Santo Agostinho diria que sim. Nunca se teve tanta informação e tão acessível. Sabe-se tudo sobre tudo. Eu me pergunto: Será isso um novo tipo de inteligência? Ou a consagração da superficialidade?
Me parece que as informações vêm sendo replicadas de forma indiscriminada. Isto é, sem reflexão ou filtro, gerando uma dificuldade de interpretação e entendimento.
Talvez o conceito de pensar tenha sido sempre nebuloso, confundido, sobretudo, com a capacidade de armazenar informações. O fato de uma pessoa ser informada, não significa que ela pense, reflita e tenha discernimento. Ela é simplesmente informada. Pensar é outra coisa. Isso porque o ato de pensar é livre de julgamento e referências culturais ou morais. É um ato de verdadeira liberdade.
Faço um exemplo: ao conhecer uma pessoa, qual a primeira coisa que tendemos fazer? Julgar. Buscamos nosso repertório cultural para “adivinhar” sobre o recém-conhecido. E a partir daí desfiamos nossos pré-conceitos para julgar o novo.
Em primeiro lugar, nos aproximaríamos com empatia e sem buscar padrões em nosso repertório já conhecido. Dessa forma, tentaríamos compreender, com o máximo de generosidade, a realidade circunstancial e essencial do sujeito julgado.
Esta é a essência do pensar: Procurar entender o imenso espectro que envolve cada pequena realidade. Refletir a respeito. Doar-se de coração e alma. Porque ninguém, nenhum de nós existe isoladamente. Somos seres dentro de uma contingência. Somos observadores e observados, todos nós. E o modo como somos percebidos ou percebemos o outro interfere, e muito, em nossas vidas.
Evidentemente não é tarefa fácil. Pensar desestabiliza muito. É preciso um arsenal de qualidades humanas para ter a coragem de pensar e mudar o já pensado. Requer generosidade, inteligência, capacidade de reflexão, empatia, introspecção, abertura cultural, maturidade, segurança pessoal, coragem.
Pensar não produz verdades absolutas ou regras a serem seguidas. Tampouco é lucrativo ou produtivo no sentido utilitário destas palavras. Pensar te faz conhecer, entender, compreender. Para que serve? Nada. Ou tudo. Serve para perceber a essência da vida.
A defesa da rigorosidade comportamental é um dos indícios mais claros de insegurança pessoal. Frente ao desconhecido, fogo! Antes de parar para pensar, refletir, analisar, dispara-se um repertório amplamente conhecido e estabelecido, portanto, garantido. Pronto, tudo resolvido. Não se muda nada. Ninguém entra, ninguém sai.
Por isso é tão difícil sair do próprio umbigo cultural. Ir até o outro, compreender a cultura do outro, respeitá-la (mesmo não querendo fazer parte dela). Dialogar. A cultura é uma piscina sem bordas na qual estamos mergulhados até o pescoço. Sair disso seria perder todas as referências. Ficar só. Então, o que fazer?
Para transcender tudo isso, se elaborar intelectualmente e espiritualmente, construir relações verdadeiras, de respeito mútuo, tomar decisões conscientes (inclusive consciente do preço a se pagar a cada decisão tomada), o único caminho é por meio desse difícil ato de pensar. Não existe outro jeito para a construção de si mesmo e de um mundo melhor em todos os sentidos.
Pensar exige, inclusive, abandonar completamente o mundo das aparências, com o qual estamos tão familiarizados e no qual nos sentimos em casa e adentrar em um mundo mais abstrato. É uma atividade, digamos, do espírito, invisível e muda. Mas que tem a força transformadora mais potente em absoluto.
Para encerrar, repito Santo Agostinho: Pensar é um ato de amor. Consigo mesmo e com o próximo. Pensem…
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Carolina Michelini nasceu em Joinville (SC), mas hoje divide sua vida entre o Brasil e a Itália.
Formou-se em Psicologia, especializou-se em Psicopedagogia e estudou Filosofia. Além de autora premiada, Carolina é também musicista e toca violoncelo.
É autora de vários livros para crianças, como Pense bem – descobrindo a Filosofia, A carta, O violino, entre outros.
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