Quando abordamos a responsabilidade dos cuidadores, o termo “pais” é comumente utilizado, mas nas dinâmicas escolares, é a figura materna que recebe maior destaque. A psicanalista Vera Iaconelli, doutora em Psicologia pela USP, identifica esse fenômeno como “maternalismo”, um discurso que reforça o papel das mulheres como mães e trabalhadoras domésticas não remuneradas.
No livro “Manifesto antimaternalista: Psicanálise e Políticas da Reprodução,” Iaconelli expõe exemplos do impacto do maternalismo, incluindo a expectativa de devoção materna como condição para a criação de filhos saudáveis. Segundo ela, isso desumaniza as mães, reduzindo-as a entidades sem subjetividade.
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A psicanalista destaca a influência histórica da figura da babá, herança do passado escravagista no Brasil. Ela enfatiza que em países com uma cultura machista, como o Brasil e o Japão, as mulheres são submetidas a pressões distintas, contribuindo para desigualdades de gênero e questões demográficas.
A entrevista aborda a jornada de trabalho excessiva enfrentada pelas mulheres, especialmente após a revolução sexual dos anos 1960. Iaconelli argumenta que, embora as mulheres tenham ingressado no mercado de trabalho, a contrapartida na divisão de responsabilidades domésticas não ocorreu, levando a uma sobrecarga e penalização das mães.
A psicanalista critica a categorização da “mãe narcisista”, argumentando que ela surge como um julgamento moral baseado na resistência das mulheres em aceitar exclusivamente o papel de cuidadoras. Ela destaca a necessidade de enxergar as mães como indivíduos diversos, com diferentes trajetórias de vida.
Iaconelli discute a persistência de ideais como devoção e sacrifício na criação dos filhos, apontando para a carga mental contínua enfrentada pelas mães, mesmo quando as tarefas são compartilhadas igualmente. Ela enfatiza a importância de mudanças na mentalidade para superar o burnout materno.
A psicanalista propõe a implementação de políticas públicas que promovam a igualdade de gênero, como creches em empresas e licenças parentais. Ela destaca a necessidade de reconhecimento do Estado e das empresas na criação da nova geração, defendendo a autonomia das mulheres nas escolhas reprodutivas.
Iaconelli aborda a sensibilidade do tema do aborto no Brasil, destacando a resistência em dar à mulher o direito à escolha, o que contraria o maternalismo. Ela alerta para os custos sociais, econômicos e de saúde associados à falta de autonomia reprodutiva.
A entrevista conclui com a abordagem da diversidade nas estruturas familiares e seu impacto na psique das crianças. Iaconelli ressalta a importância de legitimar diferentes arranjos familiares, combatendo o estigma e reconhecendo as diversas formas positivas de cuidado infantil.
Vera Iaconelli destaca a necessidade de romper com o maternalismo, buscando uma visão mais igualitária na criação de filhos. Suas reflexões indicam a importância de mudanças sociais e políticas para promover uma abordagem mais equitativa, proporcionando às mulheres a oportunidade de exercer diferentes formas de maternidade.
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Fonte: Crescer
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